Estabelecidas as premissas utilizadas no momento pela jurisprudência, passamos a sugerir argumentos que favorecem o deferimento de honorários advocatícios no processo do trabalho.
A primeira questão é de índole constitucional. O advogado é indispensável à administração da justiça, conforme expressa o artigo 133 da Constituição Federal. Deste modo, o artigo 791 da CLT, a permitir a demanda sem advogado, deve ser interpretado restritivamente, como hipótese excepcionalíssima, e não como regra. É que de nada adianta facilitar o ajuizamento da demanda, pela via da reclamação pessoal, e prejudicar a própria defesa do direito em si, em razão da falta de condições técnicas do trabalhador para deduzir suas pretensões em juízo. Dou voz, neste ponto, para Jorge Luís Souto Maior (Direito Processual do Trabalho: Efetividade. Acesso à Justiça. Procedimento oral. Editora LTr. São Paulo, 1998, p. 130/131), para quem:
“O afastamento do advogado implica relegar a causa trabalhista a um segundo plano de importância, agravado pelo fato de que as controvérsias trabalhistas já não são tão simples assim. Além disso, o serviço prestado por um servidor da Justiça não seria apto a substituir o profissional habilitado para tanto, o advogado. Nestes termos, a não exigência de advogado, embora pareça facilitar o acesso à Justiça, na verdade inibe-o, impedindo que se atinja a ordem jurídica justa. O acesso à justiça, cabe dizer, caracteriza-se pela efetiva defesa dos interesses jurídicos e não pela mera facilitação do ingresso em juízo”.
Realmente.
Pensar um processo no qual o trabalhador vai sem advogado pedir a baixa de um contrato em sua carteira de trabalho, referente a uma empresa que fechou as portas há alguns anos atrás não faz mal algum. No entanto, não se pode desprezar que as relações jurídicas trabalhistas alcançaram complexidade que dificulta até mesmo a atuação de advogados com pouca experiência na área, o que dirá dos trabalhadores, leigos e com pouca instrução. Será que é fazer justiça dizer que o trabalhador pode se virar em juízo, avaliando a distribuição do ônus da prova, impugnando preliminares processuais as mais variadas, interrogando o preposto e testemunhas, acompanhando laudo pericial após formulação de quesitos, apresentando embargos de declaração e demais recursos? O trabalhador vai discutir premissas de responsabilidade dos réus, formação de litisconsórcio, subordinação estrutural, requisitos para a equiparação salarial e tantas esquisitices criadas no juridiquês? E ainda vamos continuar negando os honorários porque contratar advogado é um capricho desnecessário. Por quê o trabalhador não optou por exercer o jus postulandi? Por quê não se socorreu da assistência sindical?
Diante do artigo 133 da Constituição Federal, o TST editou a súmula 329, no ano de 2003, com o seguinte teor:
SUM-329 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 133 DA CF/1988 (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003. Mesmo após a promulgação da CF/1988, permanece válido o entendimento consubstanciado na Súmula nº 219 do Tribunal Superior do Trabalho.
Em que pese parecer consolidada a matéria, apostamos num processo de mutação constitucional, pelo qual, sem qualquer mudança da Constituição, passemos a entender pela imprescindibilidade do advogado nos feitos trabalhistas, como regra. Digo isso também por considerar que a matéria está fora de foco, ao ser questionado o artigo 791 da CLT apenas em face do artigo 133 da Constituição Federal. Na realidade, o descompasso maior da regra celetista revela-se em relação ao princípio da assistência jurídica integral, a ser prestada pelo Estado àqueles que comprovarem insuficiência de recursos, na forma do inciso LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal. Não bastasse, viabilizar o trabalho do advogado no processo trabalhista é fazer cumprir o mandamento constitucional que assegura aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (inciso LV do artigo 5º). Como negar que o patrocínio por advogado de confiança da parte seja, em lugar de mero capricho, um requisito inafastável para a garantia da defesa de seus interesses em juízo?
Nesta linha, temos precedente na jurisprudência:
TRABALHISTA – PROCESSUAL – EQUIPARAÇÃO SALARIAL – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – Atendidos os requisitos do art. 461 da CLT, ou seja, idêntica função, trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador e na mesma localidade, tem direito o obreiro a equiparação salarial. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – DEFERIMENTO – A indispensabilidade da intervenção do advogado no processo traduz princípio de índole constitucional. Inconcebível exercício de ampla defesa, constitucionalmente assegurada, sem a presença do causídico. Honorários advocatícios devidos em homenagem ao princípio da sucumbência, em respeito à norma legal e hipossuficiência do obreiro. (CF, art. 133; CPC, art. 20, § 3º; Lei nº 8.906/94, art. 23 e Lei nº 5.584/70). Recurso ordinário conhecido e improvido. (TRT 22ª R. – RO 01324-2003-003-22-00-5 – Rel. Juiz Wellington Jim Boavista – DJU 01.06.2005 – p. 03)
O jus postulandi teve sua importância, mas agora chega. O direito e o processo do trabalho não são mais simples como pareciam. O país já conta com profissionais da advocacia em todos os rincões, aptos a defender os interesses das partes no processo trabalhista. Vamos ler a lei no contexto e pelo impacto da realidade que nos cerca, e na perspectiva do futuro que se abre. Olhar apenas pelo retrovisor não nos levará a lugar algum. Deixemos de lado o comodismo, ainda que, como diz a música de Zeca Balero, “é mais fácil mimeografar o passado que imprimir o futuro”.
Outro ponto a ser fixado é que as regras invocadas pela jurisprudência para negar os honorários advocatícios foram revogadas!
No caso, o caput do artigo 14 da Lei 5.584/70 dizia que “na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador”. Por sua vez, o § 1º do artigo 14 indicava que ”a assistência é devida a todo aquele que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família”.
Substituindo estas regras, a Lei nº 10.288/01, acrescentou o § 10º do art. 789 da CLT, com a seguinte redação: § 10. O sindicato da categoria profissional prestará assistência judiciária gratuita ao trabalhador desempregado ou que perceber salário inferior a cinco salários mínimos ou que declare, sob responsabilidade, não possuir, em razão dos encargos próprios e familiares, condições econômicas de prover à demanda.
Tendo sido a matéria alterada e regulamentada pela nova regra, temos por sua revogação tácita, na forma do art. 2º, § 1º, da LICC.
Posteriormente, o § 10º do art. 789 da CLT foi revogado pela Lei nº 10.537/2002, de modo que não se pode conferir efeito de repristinação ao dispositivo da Lei 5.584, não existindo mais no mundo jurídico a norma que, segundo a jurisprudência do TST, torna a assistência judiciária exclusiva para o sindicato. Há precedentes pela revogação do art. 14 da Lei 5.584: "HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – No processo do trabalho são devidos apenas com base, atualmente, na Lei nº 1.060-50, na medida em que a Lei nº 10.537-02 revogou o artigo 14 da Lei nº 5.584-70. Assim, quando o trabalhador ou quem o representa, mesmo de forma sintética, declara sua dificuldade econômica para demandar, e tal assertiva não é desconstituída, conforme autoriza a Lei nº 7.510-86, que alterou a de nº 1.060-50, são devidos honorários advocatícios, na base de 15% sobre o montante da condenação." (TRT 9ª R. – Proc. 00404-2003-069-09-00-6 – (04754-2004) – Rel. Juiz Luiz Eduardo Gunther – J. 12.03.2004).
Para contrariar este tese, o TST editou a OJ 305 da SDI-I, só para repetir o que já foi afirmado na súmula 219: OJ-SDI1-305 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REQUISITOS. JUSTIÇA DO TRABALHO. DJ 11.08.03. Na Justiça do Trabalho, o deferimento de honorários advocatícios sujeita-se à constatação da ocorrência concomitante de dois requisitos: o benefício da justiça gratuita e a assistência por sindicato.
Por outro lado, data vênia, em momento algum a Lei nº 5.584 afirma que somente o sindicato possa prestar a assistência judiciária. Pelo contrário.
A lei foi formulada para reafirmar o que a CLT já dizia, impondo ao sindicato o dever de prestar os serviços de assistência judiciária para os associados (artigo 514, b, da CLT), com o custeio do imposto sindical, na forma do art. 592, II, d, da CLT. Deste modo, temos que a Lei 5.584 veio para estender a assistência sindical para todos os integrantes da categoria, ainda que não associados (o que está expresso no artigo 18 da Lei nº 5.584), já que o serviço é custeado pelos recursos oriundos do imposto sindical, pago por todos. Além disso, e para viabilizar a prestação do serviço pelo sindicato, a Lei era necessária, para estipulação da regra constante do artigo 16, pela qual “os honorários do advogado pagos pelo vencido reverterão em favor do Sindicato assistente”. Claro aqui que os honorários são do advogado, o que é reforçado no momento pela regra do artigo 23 do Estatuto da OAB. No entanto, à época, havia a discussão se os honorários seriam devidos na assistência judiciária trabalhista. A polêmica gerou, inclusive, a edição da súmula 450 STF, pela qual “são devidos honorários de advogado sempre que vencedor o beneficiário da justiça gratuita”. Em laborioso estudo, o magistrado Kleber de Souza Waki colheu os precedentes que motivaram esta súmula. Revela que dos três precedentes a motivar a súmula, dois são de processos trabalhistas.
HONORÁRIOS DE ADVOGADO. DIREITO À PERCEPÇÃO POR PARTE DO ASSISTENTE JUDICIÁRIO DA PARTE VENCEDORA. A parte vencida deve honorários do assistente judiciário do seu contendor, se êste vence a demanda” (RE 34.061-DF, Relator Ministro Villas-Bôas, 2ª Turma, STF, 23/09/1958)
EMENTA: Se, no processo trabalhista, o vencedor é beneficiário de justiça gratuita, deve ser condenado o vencido a pagar-lhe os honorários de advogado. (RE 51.029, 2ª Turma, STF, Relator: Ministro Victor Nunes, j. > 4.9.1962, audiência de publicação: 17/10/1962
Esta súmula é anterior a Lei 5.584/70. Portanto, o art. 791 da CLT, a prever a capacidade postulatória das próprias partes, não é e nunca foi obstáculo ao deferimento de honorários advocatícios.
Por falar em súmula do STF, torna-se necessário fazer menção ao verbete de número 633, a indicar: É incabível a condenação em verba honorária nos recursos extraordinários interpostos em processo trabalhista, exceto nas hipóteses previstas na Lei 5.584/70. Esta súmula dá a falsa impressão de que está a legitimar o entendimento consubstanciado na súmula 219 do TST. Conforme bem examinado por Kleber Waki, os precedentes que inspiram a súmula, a exemplo do ED-RE 180165-4-SP, Relator Ministro Maurício Corrêa, fixam a premissa de que os honorários são indevidos no recurso extraordinário trabalhista por força de política judiciária. Quis o Supremo dizer que a lógica do processo do trabalho é isentar o trabalhador das despesas decorrentes da sucumbência, até como meio de não desestimular o livre acesso à justiça. A súmula 633 do STF foi formulada quando a Corte julgou centenas de recursos extraordinários envolvendo a tese de direitos adquiridos em planos econômicos. Em grande parte destas demandas, o TST reconhecia o direito invocado pelos trabalhadores e o STF reformava tais decisões, invertendo o ônus da sucumbência. Deste modo, embora não pareça, o Supremo pretendeu, por meio da súmula 633, apenas verbalizar que o trabalhador cuja demanda foi julgada improcedente responderá pelas custas do processo, mas não pelos honorários sucumbenciais. Tal premissa é válida e adequada para o processo do trabalho, de modo que não sustentamos a mera aplicação da sucumbência para quem perder o processo. No caso, o direito processual deve ser moldado para realizar o direito material. Assim, na forma do artigo 2º da CLT, o empregador responde pelos riscos de sua atividade econômica, o que inclui as despesas com seu advogado para defesa de seus interesses em juízo, ainda que tenha razão.
Quando digo isto, muitos devem estar pensando na nocividade de tal entendimento, pois os reclamantes tenderão a abusar nos pedidos, sabendo que não responderão por sucumbência nenhuma. Dirão que a sucumbência tem efeito pedagógico, para o trabalhador e para o advogado.
Não é bem assim.
A condenação por litigância de má-fé, em situações de nítida deslealdade do trabalhador pode funcionar como mecanismo para coibir os abusos, já que a gratuidade da justiça não pode servir de escudo para quem serve-se do processo para finalidades escusas.
Agora, a improcedência do pedido nem sempre decorre de má-fé. O direito do trabalho é dinâmico e por isso sempre surgem novas situações a demandar formulação de teses pelos advogados. Algumas são consagradas de pronto. Outras não vingam. Outras são consideradas até abusivas no início, mas depois tornam-se tese majoritária. Deste modo é que a mera fixação de honorários pela sucumbência, ainda que o beneficiário da justiça gratuita, não seja obrigado ao pagamento, seria nociva ao desenvolvimento do direito do trabalho, inibindo o acesso à justiça.
Retomando a questão da não-exclusividade da assistência judiciária pelo sindicato, lemos o artigo 17 da Lei nº 5.584/70: Art 17. Quando, nas respectivas comarcas, não houver Juntas de Conciliação e Julgamento ou não existir Sindicato da categoria profissional do trabalhador, é atribuído aos Promotores Públicos ou Defensores Públicos o encargo de prestar assistência judiciária prevista nesta lei. Parágrafo único. Na hipótese prevista neste artigo, a importância proveniente da condenação nas despesas processuais será recolhida ao Tesouro do respectivo Estado.
Deste modo, a prestação de assistência judiciária pelo sindicato não é imprescindível. Ademais, com a prestação do serviço por outros agentes a despesa processual, ou seja, os honorários advocatícios, também são devidos pelo empregador sucumbente. A norma deve passar pelo filtro da Constituição de 1988. No caso, o serviço de defensoria pública não é disponibilizado de modo a atender o trabalhador, além do que o Ministério Público deve concentrar-se em missões maiores estipuladas pela Constituição de 1988, na defesa da ordem jurídica e dos interesses da sociedade e pela realização dos direitos fundamentais. Assim, devemos entender que a Lei nº 5.584 complementou, e não substituiu plenamente a Lei nº 1.060/50, integrando com esta um poderoso sistema de garantia de acesso ao Judiciário pelo trabalhador hipossuficiente.
Tanto a lei nº 5.584 não possui plena autonomia na regulamentação da assistência judiciária que ainda hoje faz menção a forma de comprovação da hipossuficiência, há muito considerada revogada. No caso, lemos as seguintes regras nos §§ 2º e 3º do artigo 14 da Lei:
§ 2º A situação econômica do trabalhador será comprovada em atestado fornecido pela autoridade local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, mediante diligência sumária, que não poderá exceder de 48 (quarenta e oito) horas.
§ 3º Não havendo no local a autoridade referida no parágrafo anterior, o atestado deverá ser expedido pelo Delegado de Polícia da circunscrição onde resida o empregado.
Curioso é que o § 3º do art. 14 da Lei 5.584 deixou de ser aplicado em razão de alteração do art. 4º da Lei 1.060, promovida pela Lei 7.510/86, bastando a partir de então a declaração de pobreza, dispensando, assim, o atestado passado pela delegacia de polícia ou por autoridade do Ministério do Trabalho. Nenhuma voz levantou-se para dizer que o processo do trabalho conta com regra própria e, assim, a novidade estipulada na lei 1.060 não seria aplicável.
Considero, deste modo, que a lei 5.584 deve ser interpretada como uma ressalva da Lei 1.060, já que esta última só permitia a assistência judiciária mediante patrocínio da defensoria pública ou de advogado dativo, nomeado pelo juiz. Não bastasse, por determinação expressa do legislador, a lei 1060 aplica-se ao processo trabalhista, conforme consta em seu artigo 2º:
Art. 2º. Gozarão dos benefícios desta Lei os nacionais ou estrangeiros residentes no país, que necessitarem recorrer à Justiça penal, civil, militar ou do trabalho. Parágrafo único. Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
Deste modo, pugnamos pela aplicabilidade do artigo 11 da Lei 1.060 ao processo do trabalho:
Art. 11. Os honorários de advogados e peritos, as custas do processo, as taxas e selos judiciários serão pagos pelo vencido, quando o beneficiário de assistência for vencedor na causa.
§ 1º. Os honorários do advogado serão arbitrados pelo juiz até o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o líquido apurado na execução da sentença.
§ 2º. A parte vencida poderá acionar a vencedora para reaver as despesas do processo, inclusive honorários do advogado, desde que prove ter a última perdido a condição legal de necessitada.
Não aplicaríamos apenas o § 2º, em seu final, porque já fixamos a premissa de que, em razão de política judiciária adotada pelo legislador, os trabalhadores nunca pagarão despesas de sucumbência.
A exclusividade da assistência pelo sindicato viola o direito do necessitado de escolher o seu próprio advogado, já que a lei 1.060 estabelece a preferência na nomeação do advogado indicado pelo assistido, desde que o profissional aceite o encargo (artigo 5º, § 4º). Por outro lado, a exclusividade importaria em negativa do acesso ao Judiciário pelos trabalhadores de categorias inorganizadas em sindicato. Não bastasse, há que ser dito que muitos sindicatos não têm exercido bem o seu papel de representante dos interesses da categoria. Assim, no lugar de buscar conquistas para os trabalhadores, muitos tem se ocupado em aderir ao retrocesso social provocado por normas coletivas que flexibilizam e buscam frustrar a aplicação de direitos trabalhistas básicos. Assim, o sindicato, querendo ser moderno, praticando o direito do trabalho de emergência ou o pomposo nome de flexi-security negocia a supressão de intervalo destinado a repouso e alimentação, em especial nas jornadas 12x36 horas. Aceita regimes de compensação de jornada prejudiciais à saúde e à socialização do trabalhador. Renunciam horas in itinere com o argumento de que os empregadores estão concedendo a grande vantagem de fornecer gratuitamente o transporte. Reduzem percentuais de adicional de periculosidade. Aceitam a prorrogação de jornada em atividade insalubre sem nenhum estudo prévio acerca do impacto da medida na saúde do trabalhador. É este o sindicato que vai para a justiça prestar a assistência judiciária? A entidade terá condições de formular pretensões com o intuito de declarar a nulidade das absurdas cláusulas fixadas pelo mesmo sindicato na norma coletiva?
Quero agora tecer considerações sobre o entendimento de que os honorários caibam apenas nas lides que não se relacionam com um vínculo empregatício. Já demonstramos que tal entendimento não coaduna com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e que o artigo 791 da CLT não é obstáculo para o deferimento de verba honorária. No entanto, na lógica da isonomia, a tese expressa na Instrução Normativa 27 do TST e na súmula 219, item III, não pode ser validada.
Pensemos alto duas situações que demonstram a inconveniência deste posicionamento.
A nova competência da Justiça do Trabalho revela o desajuste do sistema: uma empresa foi autuada por descumprir uma norma de proteção ao trabalho. Ingressa com ação e obtém a anulação do auto. Com base na IN 27 o juiz defere honorários advocatícios, a serem pagos pela União. No mesmo caso, o trabalhador ingressa com ação individual para pleitear o direito sonegado pela empresa autuada. O juiz deu-lhe razão e deferiu o pedido. Vai ter que tirar uma parte de seu crédito para pagar o advogado.
Outro caso, mais estranho ainda. Um trabalhador, contratado formalmente como representante comercial, pleiteia o reconhecimento do vínculo empregatício e, sucessivamente, caso negado, direitos decorrentes da relação civil (diferenças e comissões retidas, aviso prévio, indenização por tempo de serviços e outras verbas). Reconhecido o vínculo, o juiz indefere o pleito de honorários, porque poderia ter exercido o jus postulandi ou buscado a assistência sindical. Rejeitado o reconhecimento do vínculo de emprego, e reconhecidos direitos decorrentes da relação de trabalho, caberá a condenação em honorários advocatícios, pela existência de uma relação de trabalho. Credo!
Esta distinção não tem o menor cabimento!
Assim, pelo princípio da isonomia, não faz sentido que os trabalhadores eventuais e autônomos tenham a garantia processual de percepção de honorários advocatícios e os trabalhadores empregados não.
Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, 4ª Turma, autos do Recurso Ordinário n. 01663.2007.201.02.00 – 8, Relatora Desembargadora Ivani Contini Bramante. Os Princípios do Acesso à Justiça, da ampla defesa e do contraditório (artigo 5º, incisos XXXV e LV da Constituição Federal) pressupõem a defesa técnica do trabalhador, por profissional qualificado, não sendo possível restringir o direito do mesmo em optar pela nomeação de advogado particular, nos termos do art. 133 da Carta Magna. Em que pese a inaplicabilidade do princípio da sucumbência e a possibilidade do jus postulandi no Processo do Trabalho, a condenação em honorários advocatícios tem amparo no princípio da restituição integral, expresso nos artigos 389, 404 e 944 do Código Civil.
Agora, se é para usar o parâmetro do jus postulandi como critério norteador único da condenação em honorários advocatícios, que tal ressalvar a aplicação das súmulas nos casos de terceirização, obrigando o tomador de serviços a pagar honorários advocatícios, haja vista que não estará no feito na condição de empregador e, pelo contrário, invoca quilométricas preliminares para defender que nem deveria figurar no pólo passivo?
Creio que já demos elementos suficientes para que os honorários advocatícios sejam deferidos de ofício pelo magistrado, em decorrência do reconhecimento de créditos trabalhistas em favor do empregado.
No entanto, é preciso investigar a aplicação do novo Código Civil e a possibilidade de cobrança de honorários contratualmente ajustados entre o trabalhador e seu advogado, na perspectiva do princípio da restituição integral. A tese é boa e decorre dos artigos 389, 395 e 404 do novo Código Civil.
Art. 389/CC: Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Art. 395/CC. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Art. 404/CC. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
Como era de se esperar, o Tribunal Superior do Trabalho tem entendido que tais regras não se aplicam ao processo do trabalho.
(...) 5. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS CONTRATUAIS. É inaplicável o disposto no art. 389 do Código Civil, tendo em vista que, na Justiça do Trabalho, os pressupostos para o deferimento dos honorários advocatícios encontram-se previstos no art. 14 da Lei nº 5.584/70. Recurso de revista conhecido e provido. Processo: RR - 47600-92.2004.5.02.0067 Data de Julgamento: 30/03/2011, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 08/04/2011.
No entanto, já há precedente do Superior Tribunal de Justiça deferindo a indenização por danos materiais decorrentes da contratação de advogado particular para ajuizamento de reclamação trabalhista.
Isto soa estranho, porque, afinal de contas, a competência para julgar este tipo de matéria não seria a trabalhista? Entende-se, porém, que não, porque a cobrança de honorários advocatícios seria matéria de índole civil, e não trabalhista.
A decisão proferida possui a seguinte ementa:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.027.797 - MG (2008/0025078-1)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
EMENTA. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO E SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. VIOLAÇÃO DA COISA JULGADA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. HONORÁRIOS CONVENCIONAIS. PERDAS E DANOS. PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO CIVIL. 1. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados como violados, não obstante a interposição de embargos de declaração, impede o conhecimento do recurso especial. 2. O dissídio jurisprudencial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico entre acórdãos que versem sobre situações fáticas idênticas. 3. A quitação em instrumentos de transação tem de ser interpretada restritivamente. 4. Os honorários convencionais integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02. 5. O pagamento dos honorários extrajudiciais como parcela integrante das perdas e danos também é devido pelo inadimplemento de obrigações trabalhistas, diante da incidência dos princípios do acesso à justiça e da restituição integral dos danos e dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02, que podem ser aplicados subsidiariamente no âmbito dos contratos trabalhistas, nos termos do art. 8º, parágrafo único, da CLT. 6. Recurso especial ao qual se nega provido. STJ, Terceira Turma, Publicado no DJE em 23/02/2011.
Entendam o caso.
Um trabalhador ingressou com ação na Justiça do Trabalho de Minas Gerais pleiteando verbas trabalhistas que lhe foram sonegadas ao longo do contrato de trabalho. O feito foi extinto por acordo entre as partes, tendo constado quitação do objeto do litígio e do contrato de trabalho. Cumprido o acordo, o trabalhador ingressou na Justiça Comum, pretendendo a indenização do percentual de honorários repassado a seu advogado. O STJ entendeu que a quitação não abrangia a verba honorária porque nada mencionou-se a respeito, devendo a quitação ser interpretada restritivamente, na forma do artigo 843 do Código Civil, razão pela qual não haveria também coisa julgada a impedir a tramitação do feito.
A relatora, Ministra Nancy Andrighi deu-nos uma grande aula de como devem ser interpretadas as regras processuais trabalhistas, indicando que o artigo 791 da CLT, ao estabelecer que os empregados e os empregadores poderão reclamar pessoalmente perante a Justiça do Trabalho, “deixou evidente ser facultativa a presença do advogado nos processos trabalhistas”, mas que, “sob a ótica do acesso à justiça, o empregado tem o direito de optar por ser representado em juízo por advogado de sua confiança”. O fio condutor do julgado foi a premissa de que o processo não pode importar prejuízos financeiros à parte que tem razão, conforme reconhecido na demanda. Disse a ministra que “a concessão do jus postulandi não pode ser utilizada como fundamento para penalizar o trabalhador que resolve contratar um advogado particular”.
O STJ aplicou o princípio da restituição integral, fixando que os honorários contratuais deveriam ser ressarcidos, independentemente dos honorários de sucumbência.
A relatora invocou o art. 8º da CLT para permitir a aplicação subsidiária das regras de restituição dos honorários contratuais, previstas no novo Código Civil.
Esta decisão abre uma nova perspectiva: o trabalhador pode formular pedido de honorários advocatícios de sucumbência no processo trabalhista. Independentemente do deferimento desta verba, pode em nova ação, na justiça comum, pedir o ressarcimento dos honorários contratuais.
É triste que se tenha de promover estratégia desta natureza, mas é um caminho, até que se mude a jurisprudência da Justiça do Trabalho sobre honorários advocatícios.
E o trabalhador pode pedir os honorários contratuais na própria reclamação trabalhista? Pode, mas é um risco. Primeiro, porque pode ser declarada a incompetência material com relação ao pleito. Segundo, porque se houver indeferimento do pleito, com base na jurisprudência majoritária trabalhista formar-se-á coisa julgada em relação à questão, fechando, deste modo, as portas para discussão do tema na Justiça Comum, onde as chances de êxito podem ser maiores.
Vale pontuar, ainda, um óbice que percebo, a inviabilizar grande parte dos pleitos de ressarcimento de honorários contratuais na Justiça do Trabalho.
Quase todos os reclamantes são beneficiários da justiça gratuita. Assim, se o trabalhador não tem condições de pagar os honorários advocatícios ao adversário, a lógica indica que não terá condições de remunerar o seu advogado. É incoerente e descabido que alguém beneficiário da justiça gratuita apresente contrato de honorários pelo qual compromete-se a pagar, 20%, 30%, 40% do resultado econômico de sua ação para o advogado. Tal cláusula é nula e não pode ser adimplida por meio de intervenção judicial. Vejam só: o trabalhador não tem condições de pagar 2% do valor da causa a título de custas mas pode repassar contratualmente 30% de seu crédito bruto para o advogado!
O crédito do trabalhador deve ser considerado intangível, em especial por ter origem em direitos trabalhistas. E aqui vamos abrir as feridas.
Há algum tempo tenho condenado o empregador sucumbente a pagar honorários advocatícios, em favor do advogado assistente do trabalhador, no percentual de 15%, como determina a lei nº 1.060.
Já ouvi advogado reclamando que o percentual fixado gera um constrangimento, porque o cliente questiona: se o juiz fixou os honorários em 15%, porque o advogado está me cobrando 30%?
Outros advogados comemoram e recebem os 15% a título de sucumbência e mais 30% do crédito bruto, para fazer valer o contrato. Pessoalmente, tenho que a conduta não tem amparo legal, porque o beneficiário da justiça gratuita não pode ser compelido a pagar honorários advocatícios para ninguém, nem mesmo para o advogado que constituiu para a ação.
E, como o inferno tem subsolo, já lidamos com situações em que o advogado, prestando assistência sindical, que por lei necessariamente é gratuita, recebia a verba honorária fixada em sentença e ainda cobrava 20% dos assistidos. Um acinte! Um absurdo! Mesmo assim, o comportamento irregular e abusivo de uns poucos advogados não pode ser fundamento para a negação do próprio direito.
O que importa, em síntese, é que não há razão jurídica que justifique o status quo. A Justiça do Trabalho deve eliminar este tributo invisível pago pelo trabalhador a título de honorários advocatícios. Não é possível que o processo continue sendo demorado e caro para quem tenha razão. Não é justo que os maus empregadores pratiquem a delinqüência patronal, na feliz expressão utilizada pelo professor Rodrigues Pinto e sejam premiados com uma justiça que é praticamente gratuita, com custas pagas ao final, e sem honorários pela sucumbência.